domingo, 16 de setembro de 2012

UMA FILOSOFIA LIVRE DOS PREJUÍZOS DOS SISTEMAS


José Herculano Pires

"Léon Denis, discípulo e continuador de Kardec, percorreu toda a Europa, em meados e fins do século passado, pronunciando conferências sobre o Espiritismo, na esperança de superar as barreiras levantadas pelas religiões e pelas ciências contra a doutrina. Uma das suas principais conferências, que abalaram a Europa, intitulava-se A Missão do Século XX. Denis previa o avanço das pesquisas espíritas nos meios científicos e culturais em geral, anunciando o reconhecimento científico do Espiritismo pelas ciências. Já no final do nosso século podemos constatar o acerto de Denis. Se não houve um reconhecimento fora da Ciência Espírita, houve o reconhecimento de fatos pelas comprovações científicas, no interesse do próprio desenvolvimento das ciências.
A Ciência Espírita apresenta-se hoje como a pedra enjeitada da parábola evangélica, que teve de ser colocada como a pedra angular da cultura do nosso tempo. Sua abertura generosa, jamais se fechando em dogmas e sistemas fechados, é um desafio constante ao mundo convencional da cultura que tenta desprezá-la e não consegue libertar-se dos rumos teóricos e metodológicos por ela traçados, sem outra imposição de sua realidade do que a própria realidade dos fatos em que se fundamenta. Cassirer, filósofo alemão contemporâneo, condenou os sistemas, considerando-os como leito de Procusto, em que os fatos empíricos das pesquisas têm de adaptar-se, deformados, a uma sistemática prévia. Ao elaborar a Ciência Espírita, Kardec, muito antes dessa opinião do filósofo, declarou que o Espiritismo oferecia, ao mesmo tempo, uma filosofia e uma ciência livres dos prejuízos do espírito de sistema. A palavra grega dogma equivale apenas a opinião, mas as religiões lhe deram o sentido de veredicto intocável. Kardec se refere ao dogma da reencarnação, mas não com o sentido religioso, esclarecendo que não se trata de dogma de fé, mas de razão. Todos os princípios da doutrina estão sujeitos à crítica e à reformulação, desde que uma prova científica, prova comprovada, seja reconhecida como tal pelo consenso universal dos sábios.
Assim como, na lei universal de ação e reação, os fracassos existenciais das civilizações acarretam conseqüências desastrosas no futuro, também os sucessos resultam em consequências benéficas. Equilibram-se os pratos da balança no processo da evolução humana. Às situações conflitivas de hoje, em nosso mundo, essa lei opõe as situações favoráveis da cultura. Ao mesmo tempo em que os dragões do passado acordam em seus esconderijos, acendem-se as luzes de esperança nas conquistas atuais da Humanidade. A influência dessas conquistas sobre os povos abranda os mitos negativos do passado, predispondo o presente para os avanços necessários, na elaboração universal de um mundo melhor."

Fonte: PIRES, J. Herculano.  Evolução Espiritual do Homem - Na perspectiva da Doutrina Espírita.

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Símbolos psicológicos


O conflito familiar expresso entre Caim e Abel, no mito bíblico, constitui interessante conteúdo de reflexão sobre o impacto da palavra. Caim personifica o componente desagregador das relações: ambição, inveja, vaidade, descomunicação. A violência cometida por Caim é, também, decorrência da falta de comunicação de seus próprios sentimentos.
Se Caim iniciou, metaforicamente, a violência doméstica, assassinando o próprio irmão, o ato de “assassinar” tem sentido mais amplo.  Implica na negação da convivência com aqueles que, de alguma forma, oferecem perigos a auto-afirmação do Ego.  Abel foi pastor de ovelhas e Caim lavrador de terra. Ocorre que Caim oferecia o produto de seu trabalho ao Senhor, assim como Abel. Mas o Senhor só tinha olhos para Abel. Seria este o filho preferido? A mitologia trabalha com elementos arquetípicos do inconsciente coletivo, por isso sua atualidade. Nesse caso, em especial, queremos chamar a atenção para a falta de comunicação na mediação dos conflitos.
Há um fundo emocional que permeia o processo da comunicação, ou a falta dela, entre as pessoas. Esse fundo emocional consiste num estado de espírito (ressentido, amedrontado, colérico, sereno, confiante, ...) nutrido por cada um.  Consciente ou inconscientemente, podemos carregar bloqueios e dramas não resolvidos do presente ou do passado  reencarnatório.  Essas estruturas atuam com maior ou menor intensidade na formatação desse fundo emocional, refletindo relacionamentos caracterizados por incompreensões crônicas, ou diálogos produtivos.
Caim não comunicou seus sentimentos, provavelmente bloqueados, ao Senhor. Com isso  psiquicamente passou a anular aquele que lhe ofuscava o brilho.  Os pais parecem não ter conversado sobre o problema, deixando que ele se agigantasse.
A comunicação é faculdade natural do espírito humano, disposta para sua vida de relações. O mutismo, por seu turno, pode ser decorrente de ressentimentos e mágoas cristalizadas nos porões da mente.
O cuidado com o uso da palavra é de extrema importância. André Luiz, em seu livro Entre a Terra e o Céu, Cap. 22, explica que:

(...) a palavra, qualquer que ela seja, surge invariavelmente dotada de energias elétricas específicas, libertando raios de natureza dinâmica.  A mente, como não ignoramos, é o incessante gerador de forças, através dos fios positivos e negativos do sentimento e do pensamento, produzindo o verbo que é sempre uma descarga eletromagnética, regulada pela voz. Por isso mesmo, em todos os nossos campos de atividade, a voz nos tonaliza a exteriorização, reclamando apuro de vida interior, de vez que a palavra, depois do impulso mental, vive na base da criação; é por ela que os homens se aproximam e se ajustam para o serviço que lhes compete e, pela voz, o trabalho pode ser favorecido ou retardado, no espaço e no tempo. 

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

VALIOSAS INSTRUÇÕES DE ALLAN KARDEC



“[adeptos sinceros são] ...todos os que militam pela causa com coragem, perseverança, abnegação e desinteresse, sem segunda intenção pessoal, que buscam o triunfo da doutrina pela doutrina, e não pela satisfação de seu amor-próprio.” [Grifos meus]

Allan Kardec. O Espiritismo é uma ciência positiva. Alocução de Allan Kardec aos espíritas de Bruxelas e Antuérpia. Revista Espírita, novembro de 1864..

“Aquele que tem a intenção de organizar um grupo em boas condições deve, antes de tudo, assegurar-se do concurso de alguns adeptos sinceros, que levem a doutrina a sério e cujo caráter conciliatório e benevolente seja conhecido. [Grifos meus]

Allan Kardec – Organização do Espiritismo, item 14. Revista Espírita, dezembro de 1861.

“Como se vê, nossas instruções se dirigem exclusivamente aos grupos formados por elementos sérios e homogêneos; os que querem seguir a rota do Espiritismo moral, visando o progresso de cada um, fim essencial e único da doutrina.” [Grifos meus]

Allan Kardec – Organização do Espiritismo, Revista Espírita, dezembro de 1861, item 17.

“Sem homogeneidade, não há união simpática entre os sócios, não há relações afetuosas; sem união, não há estabilidade; sem estabilidade, não há calma; sem calma, não há trabalho sério. De onde concluímos que a homogeneidade é o princípio vital de toda sociedade ou reunião espírita.” 

Allan Kardec – Sociedade Espírita, dita da caridade de Viena – Austria -
 Revista Espírita, Junho/ 1862. 

“Cultivemos, acima de tudo, as plantas férteis, que não pedem senão para germinar. Elas são bastante numerosas para ocupar todos os nossos instantes, sem consumir nossas forças contra os rochedos inamovíveis, que Deus se encarrega de abalar ou de remover quando chegar o tempo...”

Allan KardecA luta contra o passado e o futuro. Revista Espírita, março/1863.


sexta-feira, 17 de agosto de 2012

TANATOS

Jerri Almeida

Os Gregos buscaram, inicialmente, explicar ou representar a realidade através do mito. Aproximadamente entre os séculos XII e IX a.C.,  o pensamento grego encontro na faculdade mitogênica os modelos explicativos para a vida e a morte. O que desafiava o homem a produzir os mitos? O mistério. Nesse sentido se estrutura uma visão de mundo dualista, onde o físico se explica pelo transcendente e a busca pelo significado das coisas se processa pela imaginação.
Os mitos foram, sem dúvida, os modelos explicativos possíveis ao longo de diversas culturas e civilizações. Entretanto, não podemos vê-los como simples fantasias ou delírios da imaginação, pelo contrário, neles vemos toda uma forma de explicação simbólica da vida que, atualmente, encontra valiosos instrumentos interpretativos, por parte das ciências psicológicas.
Na mitologia grega, Tanatos é o deus da morte, filho de Érebo e da Noite que o criou sozinha, gêmeo de Hipnos, deus do sono. Daí a relação estreita entre a morte e o sono/o morrer e o dormir. Tanatos era representado como um homem alado, portando uma tocha apagada. Evidentemente não deveria ser um deus muito apreciado, provavelmente,  vivia na solidão, rejeitado pelos seres humanos em seu intento infame.
A filosofia grega tem seu nascimento entre os séculos VII e VI a C. não significou, contudo, uma ruptura total com o pensamento mítico, mas pode-se dizer que houve um amadurecimento na forma do pensar. O discurso filosófico busca um saber racional, construído em boa argumentação. 
Com Pitágoras (570-496 a.C.) a morte é vista como a libertação da alma que, encerrada no corpo, cumpre um processo de aperfeiçoamento através de várias migrações em busca de uma vivência ética perfeita. Pitágoras e os pitagóricos contribuíram para o surgimento do conceito de imortalidade da alma individual e da transmigração desta, de um corpo para outro. 
 As filosofias dualistas (orfismo, pitagóricos, platonismo, Socráticos...) consideravam, de forma geral, a morte não como o fim da vida do ser, mas o término de um ciclo existencial onde o físico somente se explica pelo extrafísico, supra-sensível, transcendente.
O culto aos mortos entre os romanos  foi, provavelmente, uma herança deixada pelos etruscos e antecedeu a adoração aos deuses.  Segundo Ferreira: “A tradição antiga de manter permanentemente acesso o fogo sagrado nos lares, em homenagem aos ancestrais, nasceu juntamente com a cidade e significava uma expressão do culto aos mortos.” [1] 
Os primeiros romanos praticavam o ato de sepultar e homenagear com alimentos e bebidas os seus mortos.  Os cemitérios romanos eram construído ao longo das estradas como uma forma de afastar os mortos do convívio das cidades [2].  Entre os romanos as ideias de castigos ou recompensas após a morte praticamente não existia. A prática de adoração dos mortos, entretanto, consubstanciava uma importante forma de compensação as pessoas que haviam “deixado a vida”.
Ao contrário dos gregos, os Romanos parecem não ter demonstrado grande preocupação com a ideia da imortalidade da alma e a vida no além. Entendia-se, mesmo, que a morte seria um “repouso” após uma longa viagem [3]. O problema da vida após a morte, por certo, começa a ser divulgada entre os romanos antigos, através das várias concepções religiosas vindas, principalmente, da Grécia, da Pérsia e da Palestina, em virtude das conquistas territoriais realizadas pelos exércitos romanos. Com o Edito de Milão em 313, o imperador Constantino[4] reconhece o Cristianismo como religião (ainda não oficial) e libera sua crença no Império. Daí em diante, as ideias cristãs sobre a vida futura ganharam, cada vez mais, adeptos entre os romanos.

Notas

[1] FERREIRA, Olavo Leonel. Visita à Roma Antiga. São Paulo, Moderna, 1997, P. 60
[2] ARIÉS, Philippe e DUBY, Georges. História da Vida Privada: Do Império Romano ao ano mil.  Vol. 1. São Paulo, Cia das Letras, 1997. P. 486.
[3] Idem. P. 210-211.
[4] MACEDO, José Rivair. Religiosidade e Messianismo da Idade Média. 1ª ed. São Paulo, Moderna. Cap. 1.

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