Nessa
postagem, transcrevo um maravilhoso texto do filósofo Erich Fromm sobre a fé, para
reflexão do leitor.
"Quando
a esperança desaparece, a vida termina, na realidade ou potencialmente. A
esperança é um elemento intrínseco da estrutura da vida, da dinâmica do
espírito do homem. Ela está intimamente ligada a outro elemento da estrutura da
vida: a fé. A fé não é uma forma fraca de crença ou conhecimento; não é a fé
nisto ou naquilo; a fé é a convicção sobre o que ainda não foi provado, o
conhecimento da possibilidade real, a consciência da gravidez. A fé é racional
quando se refere ao conhecimento do real que ainda não nasceu; ela é baseada na
capacidade de conhecimento e compreensão, que penetra a superfície e vê o
âmago. A fé, como a esperança, não é a previsão do futuro; é a visão do
presente num estado de gravidez.
A
afirmação de que a fé é certeza necessita de uma restrição. É certeza sobre a
realidade da possibilidade – mas não é certeza no sentido da previsão
indiscutível. A criança pode ser natimorta prematuramente; pode morrer no
parto; pode morrer nas duas primeiras semanas de vida. Este é o paradoxo da fé:
é a certeza do incerto. É certeza em termos da visão e compreensão do homem;
não a certeza que temos do resultado final da realidade. Não precisamos de fé
naquilo que é cientificamente previsível, nem tampouco pode haver no que é
impossível. A fé é baseada em nossa experiência de vida, de nos transformarmos.
A fé que outros podem mudar é o resultado da experiência de que posso mudar.
Existe
uma distinção importante entre a fé racional e a irracional. Enquanto a fé
racional é o resultado da atividade interior da pessoa, em pensamento ou
sentimento, a fé irracional é a submissão a determinada coisa que se aceita
como verdadeira, independentemente de sê-lo ou não. O elemento essencial em
toda fé irracional é seu caráter passivo, seja o seu objeto um ídolo, um líder
ou uma ideologia. Até mesmo o cientista precisa estar livre da fé irracional
nas idéias tradicionais a fim de ter fé racional no poder do seu pensamento
criador. Uma vez provada a sua descoberta, ele não precisa mais de fé, exceto
na próxima etapa que ele estuda. Na esfera das relações humanas, ter fé em
outra pessoa significa estar certo da sua essência – isto é , da confiança e
imutabilidade das suas atitudes fundamentais. No mesmo sentido, podemos ter fé
em nós mesmos – não na constância das nossas opiniões – mas na nossa orientação
básica com relação à vida, na matriz da estrutura do nosso caráter. Essa fé é
condicionada pela experiência do eu, pela nossa capacidade de dizer “eu”
legitimamente, pelo sentido da nossa identidade.
A
esperança é o estado de espírito que acompanha a fé. A fé não poderia ser
sustentada sem o estado de espírito da esperança. A esperança não pode
basear-se senão na fé."
Fonte:
FROMM, Erich. A Revolução da Esperança. 5ª. Ed. Trad. Edmond Jorge. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1984. Pág. 31-32.
FROMM, Erich. A Revolução da Esperança. 5ª. Ed. Trad. Edmond Jorge. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1984. Pág. 31-32.