domingo, 3 de outubro de 2010

A HISTÓRIA DE JERÔNIMO

A história de Jerônimo é comovente. Nasceu no dia 1º de novembro de 1939 em Ituiutaba, Minas Gerais. Narra-se que sua infância foi a de uma criança normal. Freqüentou escola até o início do ginasial antigo. Todavia, já na adolescência, começou a sentir os primeiros sinais de sua doença, através de dores nas articulações, especialmente nos joelhos e tornozelos, que passaram a inchar e, aos dezoitos anos, já andava com dificuldade.
De família modesta, seu pai era lavrador e sua mãe lavadeira de roupas, uma mulher corajosa e determinada, pois enfrentando muitas dificuldades, jamais se permitiu o desânimo. Diante de muitas necessidades econômicas, Jerônimo, desde cedo, passou a ajudar seu pai para melhorar a renda familiar. Portador de um espírito indagador, ainda na adolescência, tomou contato com a Doutrina Espírita passando a estudar os seus ensinamentos. Dessa forma, passou a adquirir uma nova visão de Deus, agregando os inestimáveis conhecimentos sobre a imortalidade da alma, da reencarnação e, portanto, aperfeiçoando o seu conceito de destino.
Na verdade, conforme sua mãe, Jerônimo desde pequeno já não gozava de muita saúde, era um menino frágil, anêmico, doente. Com o conhecimento oferecido pelo espiritismo, percebia que o espírito reencarna com suas tendências, suas lutas, com seus problemas inerentes aos méritos e deméritos, almejando, pelo esforço pessoal, o crescimento impostergável.
Certo dia, quando se dirigia a um bairro da cidade, ao passar em frente a uma alfaiataria, Jerônimo ouve uma voz lhe convidando a entrar. Para sua surpresa, seu Josias, o alfaiate, lhe havia feito um “terno”. Ele, nos seus dezessete anos, nunca havia usado um. Foi rapidamente para casa, agradecendo o seu benfeitor. Naquela noite, no cinema da cidade, o filme de lançamento era: “E o vento levou”. Era a oportunidade para usar seu terno, sua gravata, seus sapatos. Mas aquela noite repleta de felicidade, ficaria também marcada em sua história por um outro motivo.
Quando chegou ao cinema, não haviam mais poltronas vazias, Jerônimo teve então que assistir ao filme, de 4 horas de duração, em pé. Foi aí que começou para ele, a jornada inicial e dolorosa de sua doença. Ao término do filme, suas pernas estavam inchadas e, ele imóvel, necessitou ser retirado nos braços do cine Capitólio. Ao chegar em casa, sua mãe assustada, necessitou, devido ao inchaço de suas pernas e pés, cortar aquela calça, que ele vestira com tanta alegria e entusiasmo. Ali começava sua história de renúncias, permanecendo os primeiros três meses no leito, impossibilitado de locomoção.
Daí para frente, Jerônimo passou a locomover-se com muletas e ainda, para ajudar sua família, trabalhou como professor rural em uma chácara. Com o tempo, veio a cadeira de rodas e, depois, a cama, em definitivo. Mas Jerônimo, muito embora os seus conflitos pessoais, não se deixava desanimar, apoiado como ele mesmo afirmava, na fé racional lhe oferecida pelo espiritismo. Ao invés das queixas que seriam compreensíveis, ele buscava no idealismo e no trabalho possível, os recursos para se manter perseverante no equilíbrio interior.
Mesmo com suas limitações, Jerônimo Mendonça fundou várias instituições espíritas que atendiam os necessitados de alimento material e espiritual. Enxugava lágrimas, consolava os aflitos falando-lhes de Deus e da imortalidade da alma, mas, sobretudo, através do seu exemplo pessoal. Quando, em certa oportunidade, participava de um programa de televisão, Jerônimo – que já não mais se movia – foi indagado pelo repórter sobre o que seria a felicidade para ele: “A felicidade para mim, deitado há tanto tempo nesta cama sem poder me mexer, seria poder virar de lado.” Naquela oportunidade, ele falara sobre o amor e o valor da vida. Ao terminar a entrevista, o telefone da emissora tocou. Uma mulher, desesperadamente, desejava falar com ele. Apresentara-se como uma senhora da alta sociedade, portadora de muita riqueza, mas infeliz. Ela havia planejado suicidar-se. Comprara ingressos para sua família ir ao teatro e alegando indisposição, ficaria em casa. Tudo estava planejado. Quando pegou o veneno para ingerir, sentiu vontade ligar a televisão pela última vez. Lá estava Jerônimo, deitado em uma cama, cego, falando sobre o prazer em viver e da felicidade. “Fiquei envergonhada!” – afirmou a mulher. “O senhor salvou minha vida!”.
Conta-se que Jerônimo, apesar de todos os seus desafios, era uma pessoa bem humorada. Em certa oportunidade, após uma palestra que fazia na cidade de São Paulo, uma jovem aproximou-se dele chorando e pedindo-lhe palavras de conforto. Mas, curiosamente, ela afirmava que durante a palestra havia tido uma visão onde um antigo calhambeque aparecia atrás dele. “Qual a explicação?” – indagou-lhe. Jerônimo jovialmente lhe diz: “-Minha filha, isso significa que nós, mesmo na condição de um calhambeque, devemos trabalhar muito, até virar um Santana.” A jovem que estava triste, ficou alegre com o exemplo daquele homem que, diante de tanto sofrimento, soubera manter o bom humor.
Em uma de suas viagens realizando palestras, Jerônimo, que era transportado com sua cama, em uma cômbi, havia retornado de Curitiba, muito cansado, com a voz fraca. Entretanto, no dia seguinte, fez, por telefone, a campanha costumeira para arrecadar donativos, alimentos para as pessoas carentes atendidas pela Sociedade Espírita. Naquela noite do dia 25 de novembro, uma irmã dedicada passou a madrugada de plantão, cuidando dele. Pela manhã, sua mãe estranhou que Jerônimo estava muito quieto. Ele havia partido como um pássaro que alçou vôo na direção dos altiplanos, rumo ao país da imortalidade.
Conforme o relato dos amigos, o velório e o enterro de Jerônimo foram emocionantes. Filas imensas de pessoas desejavam prestar-lhe a homenagem de gratidão por tudo o que fez, mas, sobretudo pelo exemplo de estoicismo, de coragem e fé que deixou.


Bibliografia

VILELA, Jane Martins. O Gigante Deitado. Matão-SP: O Clarim, 1994.

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