domingo, 11 de março de 2012

Sensibilidades


O ritmo acelerado das pessoas, com seus desafios profissionais, colaboram para distanciar, muitas vezes, a relação entre o humano e o belo. A pressa e a impaciência da rotina diária tornam o ser humano enclausurado na lógica do racional. O homem não é somente razão, mas também encantamento, imaginação.
É importante observarmos com singularidade, aquilo que, para outros, passaria despercebido. O espírito humano se caracteriza por armazenar significados através de palavras, desenhos, gestos, números, músicas, ou seja, por suas manifestações simbólicas.
Na base de tudo isso, no entanto, situa-se o desenvolvimento da imaginação, cuja tarefa, entre outras, é a de produzir a riqueza dos ideais e da sensibilidade, estimulando as capacidades criativas do ser humano. Nesse sentido, indispensável é a responsabilidade dos pais em motivarem seus filhos, desde o berço, ao exercício natural da imaginação. Contar histórias com fundo moral – enriquecedor e divertido – transformando isso em hábito, é um dos mais notáveis investimentos que se pode fazer na formação dos filhos.
Contar histórias para o filho pequeno, estimulará o exercício de sua imaginação, passando a criança, com o tempo, criar suas próprias histórias, seu mundo de fantasias, de sonhos, de personagens e enredos. Essa capacidade ideativa trabalhará para o desenvolvimento de importantes potencialidades psíquicas que, mais tarde, formarão a personalidade do indivíduo adulto: capacidade de manter e trabalhar por seus ideais, criatividade para resolver problemas profissionais, desenvolvimento da imaginação na busca por soluções inteligentes para os desafios da vida, da convivência, etc.
Ver o mundo com sensibilidade para perceber o belo, mesmo diante do caos, é atingir um nível sofisticado de percepção que transcende a criveira comum. Divaldo P. Franco, o conhecido orador espírita, conta que em diversas situações quando está sendo transportado, por ocasião de suas palestras,  ao passar por uma paisagem verdejante e florida, se detêm na observação, felicitando-se com os admiráveis quadros da natureza.
Muitas pessoas estão sintonizadas na faixa da infelicidade, justamente, por não se darem conta dos pequenos tesouros que compõem o seu dia-a-dia. Quantos pais não perceberam a beleza da relação familiar, do convívio com os filhos? Muitas famílias desconsideram, simplesmente, os ricos momentos de diálogo, sendo que os pais, no seu comportamento acelerado, nem mesmo reservam tempo para os momentos lúdicos com seus filhos.
Pessoas que, ao longo da história, se notabilizaram por sua sensibilidade, deixavam-se mergulhar na poesia da vida. Observando o silêncio das estrelas, a harmonia do cosmos, quase todos os compositores, declara Léon Denis[1], que ilustraram a arte musical, à semelhança de Bach, Beethoven ou Mozart, declaravam perceber essa harmonia de forma tão intensa que, quando compunham, chegavam a ficar em êxtase.
Os poetas, de todos os tempos, manifestam suas sensibilidades falando, no geral, de coisas simples, que permeiam o nosso cotidiano: “Mas eis a alvorada, o majestoso levantar do Sol sobre os cimos longínquos. Qual esfera de metal incandescente, o astro-rei sobre no horizonte. A princípio, os cismos dentados dos picos flamejam na luz renascente, e, de igual modo que na tarde anterior, tinha ela subido rapidamente em volta de mim, enquanto a sobra descia com igual velocidade.”[2]  Com essa poética narrativa, Denis nos descreve, com muita sensibilidade, suas impressões sobre o nascimento do Sol nos Alpes.
Quando Francisco Cândido Xavier, nosso querido Chico, iniciou suas atividades no labor mediúnico, aos 21 anos, a primeira obra psicografada por ele: “Parnaso de Além-Túmulo”, foi uma obra de poesia. Através dele, 55 autores da literatura luso-brasileira, ensaiaram 259 poemas sobre os mais diversos assuntos. Em um admirável poema, o espírito Casimiro de Abreu[3], escrevendo “aos pessimistas”, apresenta uma valiosa reflexão de sua sensibilidade:

A Terra [4]



Se há noite escura na Terra,
Onde rugem tempestades,
Se há tristezas, se há saudades,
Amarguras e dissabor,
Também há dias dourados
De sol e de melodias,
Esperanças e alegrias,
Canções de eterno fulgor!
......................................

Os sonhos da mocidade,
As galas da Natureza,
Livro de excelsa beleza
Com páginas de esplendor,
Onde as histórias são cantos
De gárrulos passarinhos,
Onde as gravuras são ninhos
Estampados no verdor.
.........................................

O dia todo é alvorada
De doces encantamentos
Da Lua, em seus brancos véus!
A tarde oscula as estrelas,
Os astros o Sol-nascente,
O Sol o prado ridente,
O prado perfuma os céus!
........................................

Se há noite escura na Terra,
Abarrotada de dores,
De lágrimas e amargores,
De triste e rude carpir,
Também há dias dourados
De juventude e esplendores,
De aromas, risos e flores,
De áureos sonhos no porvir!

Notas

[1] DENIS, Léon. O Grande Enigma. 9ª. ed. Rio de Janeiro (RJ): FEB, 1991. Págs.. 56-57.
[2] Idem. P. 165.
[3] Poeta fluminense, figura literária das mais típicas da sua época, desencarnou aos 18 de outubro de 1860, com 21 anos de idade, na cidade de Nova Fribugo, acometido de tuberculose.
[4] XAVIER, Francisco Cândido. Parnaso de Além-Túmulo.(Poesias Mediúnicas) 13ª. ed. Rio de Janeiro (RJ): FEB, 1988. Pág. 208-210.

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