domingo, 2 de outubro de 2011

A QUESTÃO CONCEITUAL


Para o filósofo idealista alemão Hegel (1770-1831), “O conceito  é a totalidade das determinações, reunidas em sua simples unidade.” Embora o conceito seja indispensável na área do saber, conceituar é limitar. É condensar um conjunto ou a totalidade do conhecimento, em suas características essenciais, a uma unidade, ou seja, a uma expressão que possa representar uma determinada realidade, em nosso caso, doutrinária.
No livro: O Que é o Espiritismo, publicado em julho de 1859, Allan Kardec apresenta os motivos que o levaram a publicar essa obra sintética, onde resume  informações iniciais sobre o Espiritismo. A obra é relevante não somente para o neófito da Doutrina, mas também para os seus estudiosos. Em seu preâmbulo, o insigne codificador desenvolve a questão conceitual do Espiritismo afirmando que:

“O Espiritismo é, ao mesmo tempo, uma ciência de observação e uma doutrina filosófica. Como ciência  prática ele consiste nas relações que se estabelecem entre nós e os espíritos; como filosofia, compreende todas as conseqüências morais que dimanam dessas mesmas relações.” 

Allan Kardec é profundamente feliz ao definir o Espiritismo, dentro de uma  elasticidade conceitual, isto é, mesmo com o problema do “conceituar é limitar”, Kardec habilmente apresentou-nos um conceito abrangente, sem deixar de ser fiel a própria natureza da Doutrina.. Assevera, detalhando-nos o conceito acima, que o Espiritismo em sua dimensão científica  “...trata da natureza, origem e destino dos Espíritos, bem como de suas relações com o mundo corporal”.  Já em seu aspecto filosófico: “O Espiritismo é uma doutrina (...) de efeitos religiosos, como qualquer filosofia espiritualista, pelo que forçosamente vai ter às bases fundamentais de todas as religiões: Deus, a alma e a vida futura. Mas, não é uma religião constituída, visto que não tem culto nem rito, nem templos e que, entre seus adeptos, nenhum tomou, nem recebeu o título de sacerdote (...)”.
A questão, talvez, mais palpitante dentro dessa análise é a questão religiosa no Espiritismo. Em seu discurso pronunciado na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, no dia 1º de novembro de 1868, Allan Kardec se expressou da seguinte forma:

“(...) então o Espiritismo é uma religião? Ora, sim, sem dúvida, senhores. No sentido filosófico, o Espiritismo é uma religião e nós nos ufanamos por isso...”

(Revista Espírita, dezembro de 1868)

Compreendemos por sentido filosófico o sentido reflexivo, lógico e racional que consubstancia a questão da religião espírita dentro de parâmetros não dogmáticos, visando trabalhar a consciência humana, não para  acreditar, mas para  compreender a realidade espiritual em suas interfaces. Esse sentido é relevante, pois torna o Espiritismo uma religião dinâmica onde se busca o conhecimento ou a verdade, pelas vias racionais, dentro de uma natural e inalienável liberdade de pensamento. Portanto, o Espiritismo é uma religião de essência, não formalizada e sem as exterioridades que, normalmente, caracterizam o panorama religioso. A questão fica ainda mais inteligível, quando analisamos o sentido filosófico de religião como: “o conjunto de deveres do homem para com Deus”.
Convém, ainda, lembrarmos que para Johann Heirnrich Pestalozzi, o verdadeiro sentido de religião estava centrado na moralidade, isto é, no desenvolvimento espiritual do ser humano. Certamente por isso, observa-nos Herculano Pires, o fato de Kardec ter aprendido com o mestre Pestalozzi, que: “a moralidade era essência da Religião e portanto a verdadeira religião”. Isso explica  Kardec ter usado, nos textos doutrinários, diversas vezes o termo “moral”  ao invés da palavra “religião”.  Segundo ainda, o eminente Prof. Herculano Pires: “Kardec recebeu dos Espíritos a confirmação dessa teoria pestalozziana. Todo o ‘Livro dos Espíritos’ a confirma, ensinando uma religião pura, desprovida de exigências materiais...”
Valendo-nos dessa singela análise, fica-nos evidente a lógica ternária do Espiritismo: Ciência-Filosofia-Religião, na dimensão conceitual  da unidade doutrinária.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 68ª ed. Feb.
_________O Evangelho Segundo o Espiritismo.  100ª ed. Feb.
_________Obras Póstumas. 22ª ed. Feb.
_________Revista Espírita. Dez/1868. Edicel.
_________Viagem Espírita. 1862.
_________O Que é o Espiritismo. 32ª ed. Feb.
PIRES, J. Herculano. O Espírito e o Tempo. 2ª ed. 1977. Edicel.
AMORIM, Deolindo. O Espiritismo e as Doutrinas Espiritualistas. 4ª ed. Celd.

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