segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

O NOVO ANO...


Na mitologia grega, quando Urano, o Céu, fecunda a Terra, nasce a geração dos Titâns e, dentre eles, Cronos, o tempo. Com extrema ferocidade, Cronos devora os seus próprios filhos, com exceção de Zeus que resiste ao tempo, conquistando a imortalidade. O tempo é implacável! É rápido como um raio de luz que cruza o ambiente com uma rapidez audaz, imperceptível. O tempo é dominador, subjuga as criaturas humanas de forma indelével e a faz suas escravas.
Voltando para a mitologia, agora romana, Jano era cultuado como o “deus dos inícios”. Divindade responsável pelo fim de uma etapa e início de outra. No calendário romano e depois cristão, deu origem ao nome “janeiro”, definido como o primeiro mês do ano. Dezembro, último mês do ano representa matemática e simbolicamente o fim de uma etapa, com suas experiências, acertos e desacertos, méritos e deméritos, felicidades e desditas. Vivemos na órbita do tempo e de suas representações.
O relacionamento humano com o tempo carrega uma forte bagagem de subjetividades ancoradas na memória que, aliás, na mitologia grega, é a irmã de Cronos. O tempo é depositário das lembranças, dos fatos vividos em família, com amigos, dos afetos e desafetos. Boas e más recordações fazem parte da vida. Algemar-se ao passado, principalmente sobre os eventos negativos, é algo que exige ser bem administrado pelo departamento da inteligência e dos sentimentos. Em nada contribui uma fixação melancólica no passado, uma vez que essa fixação, normalmente, retira da pessoa o foco principal de sua vida: o presente.
Ao aproximar-se o período de final de ano, pessoas há que se dizem envolver, sem que saibam explicar, por uma boa dose de tristeza e melancolia. Ficam quietas, buscam o isolamento evitando festas e diversões. A psicologia busca uma possível explicação para esse fenômeno em prováveis conteúdos inconscientes, vividos consciente ou inconscientemente, em algum momento da vida e que, por algum motivo, afloram nessa época: a perda de uma pessoa, um desencanto amoroso, objetivos alimentados durante aquele ano mas não atingidos, etc.
Nem todos, portanto, estão convencidos de que devem comemorar, ufanisticamente, a virada do ano. Alguns preferem o silêncio. Familiares e amigos muitas vezes não compreendem, nem respeitam, tais posturas. Cada pessoa tem sua própria forma de reagir a essas representações do tempo, pois isso mexe com conteúdos profundos de nossa alma.
Ocorre, na lógica comum, que comemorar o fim de ano é fazer o que todos fazem: vesti-se de branco, se possível ir para a beira da praia, tomar champanhe e terminar a noite numa boate ou a um show qualquer, uma verdadeira festa de passagem. Quem adota outro comportamento que fuja dessas convenções é considerado uma espécie de “subversivo”, ou deve “estar doente”.
O relacionamento do homem com o tempo possui uma dimensão cultural, simbólica, idílica ou lúdica. O final do ano, nesse contexto representa uma forte tradição cultural no universo dos rituais de passagem, herdeiros do imaginário ancestral, e dos rituais pagãos. O fato é inquestionável: somos seres fortemente influenciados pela noção de tempo. Parece haver um tempo para tudo, e comportamentos convencionados para cada situação. Negar-se a aceitar essas representações do tempo sobre nós, parece ser tarefa quase revolucionária, anarquista mesmo!
Mas, como tantas outras revoluções, que expressão até certo ponto a rebeldia humana, o rebelar-se contra o tempo, seus significados e efeitos sobre nós não mudará a temporalidade das coisas. Será uma batalha perdida! Melhor, talvez, seja aprendermos a conviver bem com o presente e tudo o que dele possamos extrair para torná-lo pleno de possibilidade e de ações afirmativas na composição de um ser humano mais ético e solidário.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

O CRISTIANISMO E O NATAL


Os historiadores do cristianismo empenham-se por encontrar os indícios materiais que comprovariam a existência do homem Jesus. Além da Bíblia, encontramos outras poucas referências a Jesus em autores como Flavius Josephus, um historiador judeu do primeiro século. Em sua obra: Antiguidades , ele afirma: “Havia por aquele tempo Jesus, um homem sábio, se for direito chamá-lo de homem...”
No século II, Tácito, um famoso historiador romano também se refere a: “...Cristo, que o procurador Pôncios Pilatos entregou ao suplício.” Seria desnecessário enumerar outras referências. O fato é que o cristianismo ganhou cada vez mais espaço dentro do declinante Império Romano, passando, também, a sofrer uma mistura cultural, quase inevitável.
Dessa forma, a data que hoje conhecemos como atribuída ao Natal, foi definida no ano 336 d.C. O 25 de dezembro, oficializado no século 4, originou as festividades do nascimento de Jesus. Foi uma transposição cultural às comemorações, na mesma data, do nascimento de Mitra, o deus-sol de origem Persa.
O Natal, entretanto, aí está, quer seja nos seus aspectos simbólicos, ou no sentimento que impele o ser humano a uma profunda revisão de seus valores. Na crise de civilização que a humanidade atravessa, a proposta cristã – fundada na ética do amor – é muito mais profunda do que as meras apelações comerciais construídas pela sociedade capitalista.
Na verdade, podemos identificar na mensagem natalina um verdadeiro desafio à renovação interior. Muito embora sem nada escrever, Jesus Cristo continua influenciando milhões de pessoas, em todo o mundo. Longe de estarem superados, os seus ensinos morais representam um admirável repositório de sabedoria capaz de promover uma convivência, entre indivíduos e povos, mais pacífica e fraterna. Em O Livro dos Espíritos, Allan Kardec na questão 625 indagando os benfeitores espirituais sobre quem seria o Ser mais notável que Deus enviou à Terra para nos servir de modelo e guia, obteve como resposta: “Jesus”.
Logo, o Natal não deve ser visto nos acanhados limites dos festejos para troca de presentes. O verdadeiro sentido do Natal se dará quando Jesus, e tudo aquilo que ele representa, nascer efetivamente na Terra. Dessa vez, não mais em uma tosca cabana, mas no coração do próprio ser humano.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

O "ENTREVIDAS"


Com o crescente aumento de pessoas que buscam o espiritismo, é natural a disseminação dos conteúdos envolvendo a realidade humana em sua dimensão de espírito imortal e pluriexistencial. Da mesma forma, as valiosas elucidações espíritas sobre os conflitos existenciais e pessoais, tem oferecido estímulos a uma releitura da vida em seus múltiplos aspectos. Queremos afirmar, portanto, que o espiritismo tem contribuído de forma muito profícua para acelerar debates e investigações no mundo científico convencional.
No final de outubro (2003) cientistas e religiosos se reuniram em Brasília em um congresso promovido pela LBV, para discutir a Morte e a Vida após Ela. Em congresso realizado na Holanda em junho de 2003, reuniram-se 230 representantes de associações e institutos de terapia regressiva, de várias partes do mundo. A psicóloga americana Linda Bacman que propôs o tema central desse congresso, dedica-se a pesquisar, através da terapia regressiva, o entrevidas, ou a vivência espiritual de seus pacientes no intervalo em que estiveram entre uma reencarnação e outra. Já a terapeuta carioca Célia Resende, assevera que a vida e a morte, tanto quanto o entrevidas, fazem parte de uma consciência global: “A vida atual, as passadas e o entrevidas são apenas etapas de experiências da consciência, alma ou espírito.” Segundo o relato de seus pacientes, no entrevidas: “há locais de natureza exuberante e prédios com equipamentos médicos e de comunicação altamente sofisticados. (...) As cidades espirituais possuem estações de transição e hospitais para acolhimento dos que chegam, situadas sobre diversas regiões do planeta”, assevera.
A revista destaca ainda que: “A descrição do entrevidas mostra que também, e principalmente, as decisões de aperfeiçoar as relações conflituosas são tomadas nesse período.” Conforme a psiquiatra paulista Maria Teodora Ribeiro, com pós-graduação em análise transacional pela Universidade de Berkeley (EUA), “é comum os pacientes se verem programando a próxima volta à Terra. Aí a pessoa entende por que pediu para voltar naquele contexto.”
Segundo os vários relatos apresentados na reportagem, destacamos o de Nicole Lerch, 45 anos, criada no protestantismo. “Ela sofria de uma tendinite crônica que a impedia de tocar violino. Em 1997, se mudou para o Rio de Janeiro, entrou na Orquestra Sinfônica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), mas passou um ano sem trabalhar e só se livrou da tendinite com a terapia (regressiva). Ela se viu como um lenhador que teve o braço esquerdo amputado depois de um grave ferimento.” Vivenciando um desdobramento espiritual, “...encontrei Ivan, um grande amigo daquela vida. Ele me mostrou que meu braço estava inteiro. Eu tinha sido atingida apenas no físico e não no espírito.”
Estamos, inexoravelmente, diante de um “desvelar” da realidade espiritual do homem. Allan Kardec, no Capitulo 1 de A Gênese, se reporta ao caráter da revelação espírita, asseverando que: “Toda revelação desmentida por fatos deixa de o ser...”. O que observamos, no entanto, é que a revelação espírita, ao contrário de ser “desmentida” está, cada vez mais, sendo comprovada. Na verdade, o caráter de universalidade dos ensinos espíritas tornar-se-ão conhecidos como princípios ou leis absolutamente naturais e, portanto, integrados ao contexto da vida. As demais áreas do conhecimento humano, integradas num todo harmônico, marcharam para o entendimento da universo humano numa dimensão multidimensional e multidisciplinar.
É, ainda, Kardec que nos adverte: “O Espiritismo, dando-nos a conhecer o mundo invisível que nos cerca e no meio do qual vivíamos sem o suspeitarmos, assim como as leis que o regem, suas relações com o mundo visível, a natureza e o estado dos seres que o habitam e, por conseguinte, o destino do homem depois da morte, é uma verdadeira revelação, na acepção científica da palavra.” Será, pelo que tudo indica, no contexto desse século XXI, que a ciência acadêmica ortodoxa/conservadora se verá diante das evidências plausíveis do espírito e da reencarnação.
Vale destacarmos a posição do professor Waldyr Rodrigues, professor da Unicamp, matemático e doutor em física pela Universidade de Torino, na Itália, entrevistado por Isto é: “O professor lembra, no entanto, que as verdades científicas são às vezes efêmeras – o que é absolutamente certo hoje pode deixar de ser amanhã. Muitas teorias são aceitas sem uma rigorosa avaliação só por virem de profissionais de prestígio. ‘Ouvimos recentemente a tese de que o universo seria finito e teria a forma de dodecaedro. A topologia do universo é também uma coisa que não se pode provar, apenas deduzir. Por isso, erra quem diz que só acredita no que a ciência pode mostrar’.”
Portanto, a posição defendida por alguns de que o espírito e a reencarnação não seriam verdades pelo fato da “ciência não poder mostrar”, cai por terra. Conforme o professor Waldyr se refere, há muitas teorias ou verdades científicas que são meras deduções e são aceitas nos meios acadêmicos. O que nos faz pensar que, em verdade, o que existe é, ainda, uma postura de preconceito por parte de alguns “cientistas” com relação ao objeto investigativo do Espírito.

(A revista “Isto é” de 12 de novembro de 2003 (n º1780) traz em sua reportagem de capa o tema: “Além da vida” – pacientes de terapia de vivências passadas contam suas experiências no período “entrevidas”, entre uma reencarnação e outra.)

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

A MADUREZA DA HUMANIDADE



Qual o papel do Espiritismo no processo de transformação social da humanidade? Duas colocações de Kardec são fundamentais para chegarmos a uma resposta. Na primeira, Kardec afirma: “Por meio do Espiritismo, a Humanidade tem que entrar numa nova fase, a do progresso moral que lhe é consequência inevitável.” E, na segunda:

O Espiritismo não cria a renovação social; a madureza da Humanidade é que fará dessa renovação uma necessidade. Pelo seu poder moralizador, por suas tendências progressistas, pela amplitude de suas vistas, pela generalidade das questões que abrange, o Espiritismo é mais apto, do que qualquer outra doutrina, a secundar o movimento de regeneração; por isso, é ele contemporâneo desse movimento. [Grifo meu]

Não há uma contradição entre elas. Seria ingenuidade pensarmos que toda a humanidade se tornaria espírita ou se apropriaria do Espiritismo e, a partir daí, mudaria seus paradigmas de vida, operando-se a tão sonhada renovação social. Obviamente, entendemos que não foi a isso que Kardec se referiu. Ele atribui esse processo de mudança a “madureza da humanidade”, ou seja, a um estágio de superação da adolescência. Partindo da teoria espírita da evolução, Kardec nos autoriza a fazermos uma analogia entre o desenvolvimento do indivíduo e o da sociedade global. Assim como o crescimento individual se opera por fases (infância-adolescência-madureza), também a humanidade conquistaria sua maturidade passando, inicialmente, por outros estágios. Mas Kardec alude que o Espiritismo é “contemporâneo” a essa “transição” e, portanto, possui condições apropriadas para “secundar” (ajudar, auxiliar) esse processo.
Por que o Espiritismo está apto a auxiliar nessa mudança? É bom lembrarmos que o Espiritismo não se reduz a um simples discurso religioso, mas possui uma sólida base teórica que compreende: uma ciência de observação, uma filosofia otimista e, portanto, uma religião com base na fé racional, retomando a essência do pensamento cristão. Por isso, Kardec justifica, através de quatro fatores, que a Doutrina Espírita contribui para o melhoramento da humanidade:

a) Poder moralizador – Estimula pelo esclarecimento, o despertar de uma consciência muito mais lúcida e comprometida com os valores nobres da vida, tornando mais compreensível, para o ser humano, a necessidade de exercitar o princípio do: “Faça aos outros, tudo o que gostaria que os outros vos fizesse”;
b) Tendências progressistas – O Espiritismo acompanha o desenvolvimento da ciência, e aproveita toda a contribuição que esta lhe ofereça;
c) Amplitude de idéias – Oferece uma cosmovisão da vida, na medida em que associa: ciência, filosofia e religião;
d) Generalidade das questões que abrange – Estuda o mundo físico e o mundo espiritual, portanto, faz a confluência entre o físico e o metafísico, o corpo e o espírito, o individual e o coletivo.

Mas Kardec tem o cuidado, compreendendo a complexidade desse processo, de afirmar que:

Fora presumir demais da natureza humana supor que ela possa transformar-se de súbito, por efeito das idéias espíritas. A ação que estas exercem não é certamente idêntica, nem do mesmo grau, em todos os que as professa. Mas, o resultado dessa ação, qualquer que seja, ainda que extremamente fraco, representa sempre uma melhora.

Se o conhecimento espírita oferece valiosos elementos para auxiliar o aperfeiçoamento dos indivíduos, também é verdade, que esse é um processo pessoal e que cada um possui seu ritmo próprio. As crises, os conflitos, as angústias e sofrimentos, também possuem o papel de estimular essas renovações. Essa mudança é naturalmente lenta, pois sedimentada numa nova ética comportamental. Sobre isso, Léon Denis foi enfático ao considerar: “A influência do Espiritismo no progresso da sociedade se processa, não no estímulo à luta de classe, mas no campo íntimo, ampliando os horizontes sobre a natureza humana e sua destinação.”
É comum pensar-se que as mudanças sociais se operam, tão somente, por revoluções, decretos políticos, ou por abalos apocalípticos. O Espiritismo, no entanto, coloca o sujeito no centro dessa questão, atribuindo-lhe a responsabilidade por aperfeiçoar seus impulsos e desejos. Atuando na sociedade onde se insere, o espírita oferecerá os exemplos possíveis, de ação solidária, fraterna, honestidade e justiça, sem se isolar ou deixar de ser jovial.
Ensinam os espíritos que cada um, da sua forma, poderá amadurecer – dentro de si – esse novo mundo, com o qual todos sonham. Certamente, um aspecto determinante de toda essa problemática, ocorre a partir das mudanças psíquicas na vida mental dos indivíduos. Evidentemente, temos os complicadores sociais, como o fator cultural, as estruturas mentais da sociedade que influenciam a família e a educação.
Apesar do pessimismo filosófico, que de certa forma tem sido característico da cultura Ocidental contemporânea, a perfectibilidade faz parte do espírito humano. O filósofo Jacques Julliard, tratando sobre o progresso escreveu: “Mas sobretudo, não ousamos imaginar um progresso moral da humanidade repousando sobre uma melhoria das condições de existência.” O progresso não é uma mera teoria criada na modernidade, mas, uma lei inexorável da vida.

Conclusão

Ao concluir o último capítulo de A Gênese , Allan Kardec praticamente de forma conclusiva, escreve: “A regeneração da humanidade, portanto, não exige absolutamente a renovação integral dos Espíritos: basta uma modificação em suas disposições morais. Essa modificação se opera em todos quantos lhe estão pré-dispostos, desde que sejam subtraídos à influência perniciosa do mundo.” Em tempos de crise de paradigmas, de fragilização de valores afirmativos da existência, de inquietudes e incertezas do mundo pós-globalizado, o texto kardequiano apresenta um enorme potencial filosófico, de referência sempre atual, para pensarmos em alternativas viáveis ao melhoramento da humanidade.
Evidentemente, Kardec não se referia a uma moral religiosa, caracterizada pelo artificialismo. Uma conduta artificial não renova ninguém, cria uma máscara temporária, para dar a impressão de pureza. Os apelos do mundo aí estão, fazem parte de nosso cotidiano, mas caberá a cada um delimitar o uso de sua liberdade. Tudo posso, mas nem tudo me convém! O equilíbrio interior é, certamente, o imperativo do progresso ético-espiritual do homem contemporâneo.
Hoje, parece óbvio que a saída para resolvermos os conflitos do espaço humano e social requer que busquemos um outro caminho. Esse “outro” caminho não é simples, pois exige trabalho e determinação. Não se trata de uma revolução social, impositiva, mas de uma “revolução individual” com base na consciência de que não estamos no mundo por um mero fatalismo biológico e que, portanto, necessitamos compartilhar uma ética do cuidado, comprometida com as Leis Morais da vida, orientadoras, em última instância, desse grande processo de renovação.

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