Jerri Almeida
Observa-se uma tendência
crescente na sociedade atual: a proliferação dos condomínios fortemente
protegidos. Diante do aumento da violência e da insegurança que permeia nas
médias e grandes cidades, uma parcela das classes mais aquinhoadas, busca nos
condomínios fechados proteção e privacidade contra o mundo violento.
Grandes muralhas buscam oferecer garantias contra a insegurança de quem tem
medo de perder o que tem, e pode pagar mais caro por sua segurança.
A arquitetura do século XXI, com todas as suas
inovações tecnológicas, faz lembrar – paradoxalmente – do mundo medieval com
suas fortificações. Naqueles tempos vivia-se a instabilidade de uma
sociedade violenta e fortemente belicosa. Saques constantes, roubos, guerras,
impeliam a ascendente classe burguesa, por volta do século X, a fortalecer as
feiras, onde os comerciantes da época reuniam-se para vender seus
produtos. Com o tempo, esses locais, conhecidos como burgos, passam a se
transformar em verdadeiras cidades medievais.
Não somente as cidades
medievais eram cercadas por muralhas, as pólis, cidades-estados da Grécia,
também eram fortalecidas com o propósito de oferecer aos seus habitantes mais
segurança, onde à vida, à liberdade e à propriedade, a cada instante corriam
risco de se perder.
Em pleno século XXI,
retomamos a mesma lógica, com um novo formato, dos burgos medievais. Os novos
burgos são denominados hoje, de “condomínios”. A Revue Française de
Psychanalyse, em janeiro de 1970, publicou um texto de Freud onde
ele afirmava: “O termo civilização designa a totalidade das obras e
organizações cuja instituição nos distancia do estado animal de nossos
ancestrais e que servem para dois fins: a proteção do homem contra a
natureza e a regulamentação das relações dos homens entre si.”
O estado de
civilização tem ensejado, ao longo do tempo, certa ideia de polidez e
prudência que nos “distancia” do estado de embrutecimento do homem dos períodos mais
primitivos.No entanto, embora as valiosas conquistas na área da cultura e da
tecnologia, o ser humano mantém sua tradição dominadora e violenta. A
agressividade se alastra, no mundo liquido moderno, em proporções
alarmantes, gerando um verdadeiro mal-estar na civilização. O estado de guerra
é incompatível com a proposta dos elementos que compõem a ideia de
civilização: racionalidade, altruísmo, bom senso, espiritualidade...
Os “burgos do mundo líquido
moderno” nada mais são do que representações de uma civilização incompleta. Nesse
sentido deixamos, para a reflexão do leitor, as seguintes questões de O
Livro dos Espíritos:
791. Apurar-se-á algum dia a
civilização, de modo a fazer que desapareçam os males que haja produzido? “Sim,
quando o moral estiver tão desenvolvido quanto a inteligência. O fruto na pode
surgir antes da flor.”
793.
Por que indícios se pode reconhecer uma civilização completa? “Reconhecê-la-eis
pelo desenvolvimento moral. Credes que estais muito adiantados,porque tendes
feito grandes descobertas e obtido maravilhosas invenções; porque vos alojais e
vestis melhor do que os selvagens. Todavia, não tereis verdadeiramente o
direito de dizer-vos civilizados, senão quando de vossa sociedade houverdes
banido os vícios que a desonram e quando viverdes como irmãos, praticando a
caridade cristã. Até então, sereis apenas povos esclarecidos, que hão
percorrido a primeira fase da civilização.”
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