domingo, 28 de abril de 2013

BURGOS DO MUNDO LÍQUIDO MODERNO


Jerri Almeida

Observa-se uma tendência crescente na sociedade atual: a proliferação dos condomínios fortemente protegidos. Diante do aumento da violência e da insegurança que permeia nas médias e grandes cidades, uma parcela das classes mais aquinhoadas, busca nos condomínios fechados proteção e  privacidade contra o mundo violento. Grandes muralhas buscam oferecer garantias contra a insegurança de quem tem medo de perder o que tem, e pode pagar mais caro por sua segurança.
 A arquitetura do século XXI, com todas as suas inovações tecnológicas, faz lembrar – paradoxalmente – do mundo medieval com suas fortificações.  Naqueles tempos vivia-se a instabilidade de uma sociedade violenta e fortemente belicosa. Saques constantes, roubos, guerras, impeliam a ascendente classe burguesa, por volta do século X, a fortalecer as feiras, onde os comerciantes da época reuniam-se para vender seus produtos.  Com o tempo, esses locais, conhecidos como burgos, passam a se transformar em verdadeiras cidades medievais.
Não somente as cidades medievais eram cercadas por muralhas, as pólis, cidades-estados da Grécia, também eram fortalecidas com o propósito de oferecer aos seus habitantes mais segurança, onde à vida, à liberdade e à propriedade, a cada instante corriam risco de se perder.
Em pleno século XXI, retomamos a mesma lógica, com um novo formato, dos burgos medievais. Os novos burgos são denominados hoje, de “condomínios”. A Revue Française de Psychanalyse, em janeiro de 1970, publicou um texto de Freud onde ele afirmava: “O termo civilização designa a totalidade das obras e organizações cuja instituição nos distancia do estado animal de nossos ancestrais e que servem para dois fins: a proteção do homem contra a natureza e a regulamentação das relações dos homens entre si.”
 O estado de civilização tem ensejado, ao longo do tempo, certa ideia de polidez e prudência que nos “distancia” do estado de embrutecimento do homem dos períodos mais primitivos.No entanto, embora as valiosas conquistas na área da cultura e da tecnologia, o ser humano mantém sua tradição dominadora e violenta. A agressividade se alastra, no mundo liquido moderno, em proporções alarmantes, gerando um verdadeiro mal-estar na civilização. O estado de guerra é incompatível com a proposta dos elementos que compõem  a ideia de civilização: racionalidade, altruísmo, bom senso, espiritualidade... 
Os “burgos do mundo líquido moderno” nada mais são do que representações de uma civilização incompleta. Nesse sentido deixamos, para a reflexão do leitor, as seguintes questões de O Livro dos Espíritos:
791. Apurar-se-á algum dia a civilização, de modo a fazer que desapareçam os males que haja produzido? “Sim, quando o moral estiver tão desenvolvido quanto a inteligência. O fruto na pode surgir antes da flor.”
793. Por que indícios se pode reconhecer uma civilização completa? “Reconhecê-la-eis pelo desenvolvimento moral. Credes que estais muito adiantados,porque tendes feito grandes descobertas e obtido maravilhosas invenções; porque vos alojais e vestis melhor do que os selvagens. Todavia, não tereis verdadeiramente o direito de dizer-vos civilizados, senão quando de vossa sociedade houverdes banido os vícios que a desonram e quando viverdes como irmãos, praticando a caridade cristã. Até então, sereis apenas povos esclarecidos, que hão percorrido a primeira fase da civilização.”

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