Muitas pessoas argumentam que suas infelicidades derivam de seus problemas. Desafios, sempre os teremos! Eles marcam o nosso processo de aprendizagem enquanto estímulos que são para o desabrochar de nossa criatividade. O cotidiano é uma busca por superar problemas dos mais variados: passar no vestibular, conquistar um emprego, superar um trauma, um fracasso, uma perda, uma queda nos negócios.
Os problemas, no sentido geral, são os estímulos pelos quais exercitamos e desenvolvemos nossas potencialidades criativas. A humanidade cresceu e se aprimorou tecnicamente através dos problemas que se apresentavam e, portanto, exigiam solução. Problemas solucionados desencadeiam um sentido íntimo de auto-realização. Todavia, nem todos os problemas são passíveis de serem resolvidos rapidamente. Às vezes, certos desafios exigirão o concurso do tempo, para o qual, a esperança, a determinação e, muitas vezes a resignação, devem estar presentes.
A incompletude humana se caracteriza, entre outras coisas, pelo “solo árido dos sentimentos” que se mantém indiferente aos apelos da “semente do bem”. Não se trata de uma mera frase de impacto, mas de empreendermos um sentido real e profundo para a vida. Mesmo os vegetais que ficam presos ao solo, buscam, instintivamente, encontrar o alimento no local onde estão – procurando a água e a luz – para se manterem ativos. A vida apresenta, constantemente, condições novas que desafiam os seres vivos e, ao homem, em particular, a agregar novas experiências que concorrem para o desabrochar de uma consciência mais plena.
Todavia, quanto maior for a imaturidade psicológica e espiritual do indivíduo, maiores serão os seus conflitos. Isso devido ao seu limitado discernimento sobre o que seja realmente a felicidade. Nesse sentido, os estímulos do conhecimento e do sofrimento incidem sobre nós e, no conjunto de nossas vivências, nos pré-dispõem ao aprendizado ou ao amadurecimento das nossas estruturas mentais de pensamento e reflexão. Isso também gera estímulos na área dos sentimentos e das emoções, visando irrigá-los com o bálsamo do enternecimento e dos valores nobres.
A proposta daquilo que chamamos de “evolução espiritual” é exatamente o desenvolvimento de um ser consciente e atuante no bem. Essa é a condição de um indivíduo que está além do seu ego, isto é, da sua identidade psicológica atual, o “eu transitório ou superficial”. A psicologia espírita, analisando o homem sob o prisma de um ser profundo, preexistente ao berço e sobrevivente ao túmulo, enfatiza, por isso mesmo, que a felicidade se desenvolve naqueles que buscam vencer seus medos, complexos de inferioridade e culpa, individualismos, orgulhos e egoísmos, desenvolvendo a confiança em si mesmos e na vida.
A postura humana, diante dos seus desafios pessoais, pode sugerir a adoção de atitudes mentais de desesperação e desânimo ou poderá estimular um sabor especial sobre a arte de viver, reinventando-se a vida diária. Costumamos ver o mundo (interno e externo) a partir das “lentes” ou dos valores que cultivamos. Mudar os valores é, portanto, mudar a forma de se relacionar com a vida cotidiana.
Algumas pessoas buscam justificar sua falta de prazer pela vida, utilizando o argumento que: “o mundo está péssimo”. Outras, todavia, nem mesmo sabem o porquê de nutrirem tal sentimento, simplesmente sentem um desgosto em viver. Consideramos, à luz do espiritismo, que o prazer de viver está, necessariamente, vinculado a um “sentido para a vida”. Uma vida com significado é uma vida prazerosa, mesmo nos momentos difíceis.
Mesmo nos momentos cinzentos e nebulosos, nas angústias, onde enfrentamos o mar tempestuoso dos problemas, necessitamos pensar e repensar a vida, para que ela tenha o sabor do bem, do amor e das construções sólidas. A vida não está aí para ser meramente “suportada”, mas, sobretudo para ser elaborada, educada, ousada. É necessário “aventurar-se”, no bom sentido da palavra, na direção dessa vida com significado mais profundo, “transgredindo-se a ordem do superficial”.
Viver a vida como um verdadeiro ideal de doação no amor, é atribuí-la um sentido profundo e realizador. Essa lógica vem sendo, consciente ou inconscientemente, mascarada pelo ser humano, que busca subterfúgios ou maneiras mais fáceis e rápidas de encontrar prazer na existência. Mergulhados na impermanência, buscamos na ilusão do prazer imediato hedonista, a satisfação de nossas aspirações mais profundas. Mas tal ilusão desconstrói o sentido da vida, fazendo com que o indivíduo se apegue e se vicie na sensação periférica.
Pessoas que passam, mesmo na adversidade, a dar um significado para suas vidas, associados ao bem, vivem a vida com mais prazer e plenitude interior. Falamos aqui do prazer da alma, diferente daquele prazer periférico e inconstante que as coisas materiais nos oferecem. Nos referimos, portanto, ao prazer que dá uma alegria mais verdadeira, capaz de gerar saúde, felicidade e que não perece ao sabor da impermanência material.
Do Livro: O Desafio da Felicidade - Em um mundo em Transformação. Editora Francisco Spinelli, Porto Alegre, 2007. Autor: Jerri Almeida
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