Em texto publicado pela Revue Française de Psychanalyse, em janeiro de 1970, Freud asseverava: “O termo civilização designa a totalidade das obras e organizações cuja instituição nos distancia do estado animal de nossos ancestrais e que servem para dois fins: a proteção do homem contra a natureza e a regulamentação das relações dos homens entre si.” Historicamente, o estado de civilização tem ensejado uma certa idéia de polidez e prudência que nos “distancia” do estado de embrutecimento do homem do período Paleolítico. Ainda, segundo o eminente psicanalista, a civilização nos remeteria a um estágio mais profundo e aperfeiçoado das relações humanas.
No entanto, embora as valiosas conquistas na área da cultura e da tecnologia, o homem mantém sua tradição dominadora e violenta. A agressividade se alastra, no mundo pós-moderno, em proporções alarmantes, gerando um verdadeiro mal-estar na civilização. O século 20 foi o mais violento da história humana, com duas guerras mundiais e outras tantas localizadas, e o século 21 parece que não será muito diferente..
O estado de guerra é incompatível com a proposta dos elementos que compõem a idéia de civilização: racionalidade, altruísmo, bom-senso, espiritualidade... A discórdia e as diferenças são expressões da diversidade humana que poderiam ser resolvidas, numa verdadeira civilização, pelos caminhos da diplomacia e da paz. Dessa forma, os senhores da guerra são aqueles que preferem impor a bandeira da irracionalidade e da insensatez, plasmando um quadro caótico no âmbito dos valores humanos.
A intolerância diante das diferenças étnicas, raciais, ideológicas e religiosas tem sido fomentada pelas pretensões econômicas das potências capitalistas que colocam o valor-financeiro acima do valor-humano, fazendo do poder e do dinheiro a centralidade de suas preocupações e investidas. Por outro lado, a sociedade humana através de seus movimentos constitutivos, passa a sinalizar a urgente necessidade de se eleger novos mecanismos de justiça e solidariedade, capaz de nortear de forma mais satisfatória as relações entre os homens.
Vivemos, portanto, os paradoxos de uma civilização em busca de sua verdadeira identidade. O caminho é possível, mas desafiador. A afirmação de uma cultura para a paz, a racionalidade, o respeito às diferenças e ao próprio ser humano, muito poderão contribuir na estruturação dos referenciais de uma civilização mais madura e realizadora.
Segundo o sociólogo português Boaventura de Sousa Santos, os militantes da paz: “São todos os que lutam por uma segurança coletiva efetivamente partilhada, pela redução das desigualdades entre ricos e pobres, por uma cultura democrática a serviço da resolução de litígios, por uma cultura de tolerância das diferenças.” Essa parece ser uma via profícua para a superação desse mal-estar civilizacional que atravessamos.
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Prezado Jerri,realmente, como afirmou kardec o Espiritismo iria secundar, isto é, ajudar a transformação da sociedade, porquanto a evolução seria consequencia do amadurecimento dela mesma.
ResponderExcluirOs espiritos também dizem, em "O Livro dos Espíritos" que a tarefa do Espiritismo, incluindo aqui o movimento, seria a destruição do egoismo, por intermédio da ampliação da Caridade (que fique claro), e também, que seria necessário criar novas INSTITUIÇÕES. Pois bem! me parece que aos poucos essas novas insituições estão surgindo, mas me entristece ver que o nosso movimento pouco tem contribuido para isso.
Embora a citação de Boaventura Santos no final seja muito interessante e seu pensamento sobre a paz encontre ressonancia em nossos sentimentos, é preciso lembrar que ele trabalha basicamente para a construção da contra hegemonia. Ora, falar de democracia ao mesmo tempo que procura criar um poder contrário é um contrasenso. Me parece, salvo melhor apreciação do assunto por especialistas, que Boaventura Santos segue a linha Gramsciana. A democracia implica em diálogo e tolerância.
Acredito que precisamos aprender o que realmente é a democracia para acabarmos com o "mal estar", digo, democracia substantiva, porque a formal nós já temos, seguindo os exemplos de Jesus e de kardec. E deveriamos começar a praticar a democracia no próprio movimento.