domingo, 22 de agosto de 2010

PULSÕES AGRESSIVAS

Freud, em sua Teoria dos Instintos, afirmou que a agressividade sexual transformará um amante num criminoso. Kardec alertou para essa questão em seu comentário à questão 685 a. de O Livro dos Espíritos: “Considerando-se a aluvião de indivíduos que todos os dias são lançados na torrente da população, sem princípios, sem freio e entregues a seus próprios instintos, serão de espantar as consequências desastrosas que daí decorrem?” Sabiamente indagou, ainda, aos benfeitores espirituais, na questão 845 da obra citada: “Não constituem obstáculos ao exercício do livre-arbítrio as predisposições instintivas que o homem já traz consigo ao nascer?” E obteve a seguinte informação:


"As predisposições instintivas são as do Espírito antes de encarnar. Conforme seja este mais ou menos adiantado, elas podem arrastá-lo à prática de atos repreensíveis, no que será secundado pelos Espíritos que simpatizam com essas disposições. Não há, porém, arrastamento irresistível, uma vez que se tenha a vontade de resistir. Lembrai-vos que querer é poder."


A estrutura mental foi dividida por Freud em três instâncias psíquicas: Id, Ego e Superego. O Id representa, segundo o psicanalista Boris Nadvorny, as pulsões, as paixões, e tem como único objetivo a satisfação dos desejos. É uma estrutura primária. O Superego é uma instância ordenadora da conduta, uma espécie de sensor moral, enquanto o Ego é o mediador dessas duas estruturas. O Ego é responsável por levar em consideração os desejos do Id (que representaria nossa ancestralidade, o cérebro reptiliano...) as exigências do Superego, e buscar harmonizar isso tudo com a realidade. A imaturidade psicológica do indivíduo faz com que o Ego desconsidere os sensores internos, cedendo aos impulsos, às pulsões e aos desejos desenfreados.
Observa-se, em grande parte dos sujeitos que cometem algum tipo de violência contra a mulher, uma associação do temperamento agressivo com o uso de substâncias como o álcool e outras drogas. A relação entre sexo, drogas e violência é muito próxima nesses casos. Na esteira da conduta em desequilíbrio, associam-se espíritos perturbadores, que vitalizam, ainda mais, comportamentos doentios que terminam em verdadeiras tragédias familiares e sociais.
No verso desses casos, sob o entendimento espiritual, encontraremos criaturas que ainda não educaram-se para as experiências da vida. Vivem na órbita de seus conflitos e de seu personalismo. A satisfação no prazer periférico, permitindo-se arrastar pelos desequilíbrios sexuais de toda ordem, além de produzir um vazio na alma, gera processos de reajustes que as acompanhará, muitas vezes, pelas veredas dos séculos.
Companheiros que vitimam suas mulheres abrem campo para dolorosas e complexas obsessões espirituais, protagonizadas por suas vítimas, que, não raras vezes, se tornam também algozes, cobrando justiça pelas vias equivocadas da vingança. Tais eventos trágicos devem, pelo menos, gerar na sociedade uma reflexão urgente sobre os relacionamentos apressados, sem que se conheça um pouco mais o outro, o seu temperamento, para se decidir efetivar um vínculo emocional em bases mais sólidas.
Muitos homens cometem violência contra suas companheiras, pois como já comentamos, não aceitam a idéia da separação. Outros, no entanto, matam na tentativa de se libertarem delas. No livro Ação e Reação, psicografado por Francisco Cândido Xavier, o espírito André Luiz narra o caso de Ildeu e Marcela. Ele era o esposo problemático, de temperamento agressivo, facilmente seduzido pelo álcool e por outras mulheres. Marcela era esposa dedicada. O casal tinha três filhos: Roberto, Sonia e Marcia. Não raras vezes, Ildeu chegava de madrugada em sua casa, alcoolizado e exibindo sinais de aventuras sexuais. Mara, uma jovem mulher que tornara-se sua amante, não lhe saía da cabeça como sendo a mulher ideal. No outro dia tornava-se agressivo e grosseiro com sua esposa, nutrindo especial antipatia de seu filho Roberto. Com suas filhas era, no entanto, cheio de cuidados e carinhos.
Com o tempo, a situação do lar tornava-se cada vez mais complexa. Ildeu mostrava-se ainda mais irritadiço. Fascinado pela amante, passou a odiar terrivelmente sua esposa. Não amava a Roberto, o filho pequeno que o olhar o acusava sem palavras. Mas não imaginava afastar-se de suas duas filhas. Em caso de separação, certamente elas ficariam com a esposa. Foi assim que lhe surgiu na mente a ideia de assassinar Marcela. Passou a articular um plano, para que a morte da esposa fosse vista, aos olhos do mundo, como um suicídio. O filho se livraria depois. Para isso, alteraria o comportamento doméstico, especialmente com a esposa. Tornou-se mais brando, afastou-se, temporariamente do álcool, e assumiu a máscara do esposo atencioso e gentil.
Ildeu armava mentalmente o quadro criminoso. Certa noite, quando a família já estava dormindo, entrou sorrateiramente em casa com um revólver em punho. Ao chegar em seu quarto, encontrou Marcela dormindo. Diante dos quadros de oração e da conduta ilibada de Marcela, os orientadores espirituais, percebendo o fato, alertaram uma das filhas do casal que encontrava-se desdobrada espiritualmente para que retornasse ao corpo. A pequena Márcia, experimentando o terrível quadro que se configurava, volta ao corpo como quem voltasse de um grave pesadelo. Gritava para que o pai não matasse sua mãe.
Diante do alvoroço geral, Marcela acorda e percebe Ildeu com a arma na mão. A mulher incapaz de suspeitar da verdadeira intenção do marido deduz que ele está disposto a se suicidar. Ela lhe implora que não cometa tão desatinado ato, esclarecendo que sabe que ele não é feliz naquele lar e que se for de sua vontade ela lhe daria o direito de separar-se, de viver definitivamente com sua amante. Ildeu aproveita o mal-entendido da esposa para evadir-se do lar, cedendo ao princípio do prazer.
Os orientadores esclarecem a André Luiz que em outra encarnação Ildeu também era esposo de Marcela. Abandonou-a para aliciar duas jovens, com quem passou a viver. Marcela casou novamente e vivia feliz. Mas, após muitos anos, doente pela instalação de um câncer, o antigo marido retorna ao lar e percebendo sua ex-esposa casada, termina por assassinar seu marido. Na seguinte reencarnação, retornam novamente na expectativa de que Ildeu eduque sua sensibilidade e repare seus equívocos. Marcela aceita ser novamente sua esposa, o filho a quem ele não gostava era o antigo marido da esposa a quem ele assassinou, as filhas com quem tinha afinidade maior eram as jovens que foram aliciadas por ele no passado. Ildeu continuou cometendo os mesmos erros do passado.

Bibliografia

ALMEIDA, Jerri. O recrudescer da violência contra a mulher. In: Jornal Diálogo Espírita. FERGS, Março/Abril 2010, Ano XV, No. 84. Porto Alegre/RS. Página 12.
FRANCO, Divaldo P. (Joanna de Ângelis) Conflitos Existenciais. Salvador-BA: LEAL, 2005.
KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Questões citadas no texto.
NADVORNY, Boris. Freud e as Dependências. Porto Alegre: AGE, 2006.
ROUDINESCO, Elisabeth. A Família em Desordem. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003. Cap. 6 – As mulheres têm um sexo.
XAVIER, Francisco Cândido. (André Luiz) Ação e Reação. Capítulo 14.

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