terça-feira, 5 de janeiro de 2010
VOZES DE PAPEL
Os filósofos antigos, que construíram o pensamento de nossa civilização Ocidental, perambulam pelas estantes, as vezes de madeira, de sebos e bibliotecas (as vezes de livrarias) na angustiante e inóspita tarefa de expressarem suas vozes de papel. A inquietude dos filósofos não os permite desanimar, mesmo que a situação atual, em qualquer lugar, apele para a cultura da imagem, apelativa e sedutora.
Assim sendo, Platão ou Aristóteles, Descartes ou Hegel, jamais imaginaram que os grandes desafios do pensamento humano, enfrentado por eles, seria o de – simplesmente – se fazerem lidos, cobiçados. Não! Certamente jamais imaginaram que um dia a juventude ou os curiosos do saber, pudessem esquecê-los, despreza-los nas poeiras arrogantes de qualquer estante.
Talvez Platão, no Mundo das Idéias, perceba melhor que as sombras do Mundo Sensível se devem, sobretudo, a indiferença infame – do mundo massificado e utilitarista contemporâneo – com a cultura que desafia o pensamento a voar além dos horizontes acanhados do homem cotidiano. Os filósofos antigos, reunidos em um café qualquer, tradicional de Paris, poderiam concluir, pelo menos os mais pessimistas, que esse mundo tecnológico e digitalizado do século XXI foi tomado de uma irreversível apatia intelectual.
O que pensaria Aristóteles disso tudo, uma vez ter afirmado – em seu livro Ética a Nicômaco – que “os legisladores tornam bons os cidadãos por meio de hábitos que lhes incutem.” ? Ora, os discurso apologéticos do presente, muito longe de estimular os bons hábitos, corroboram para que a própria fragilidade cultural dos cidadãos se multipliquem, aprisionando-os – cada vez mais – na caverna da inoperância intelectual.
Mas talvez possamos, entre um café filosófico e outro, imaginar que nem tudo está perdido, afinal, o homem – historicamente – tem se mostrado um ser capaz de superar-se, de enfrentar sua própria ignorância ou, pelo menos, de reconhece-la. Quem sabe, Nietzsche nos ajude a pensar sobre isso, quando escreveu: “Conheço muito bem as qualidades que devo ter para que alguém me compreenda...”, além da integridade de espírito, metaforicamente, assevera que é preciso “estar acostumado a viver nas montanhas”. Apesar disso, creio que o próprio Nietzsche, em seus escritos, tenha permanecido mais na base do no cume de sua montanha imaginária.
Montanhas, cavernas, ilusão, realidade, ignorância e sabedoria. Os filósofos são assim mesmo, talvez estranhos ou esquisitos para muitas pessoas. Mesmo assim, foram eles que construíram a nossa forma de pensar e talvez por isso, também sejam – isolados em suas estantes – um pouco responsáveis pela indiferença humana.
Os filósofos antigos, na vitalidade de suas páginas, oferecem o convite à filosofia, a pensar e repensar as questões contemporâneas, num constante desafio de subir à montanha e, de lá, visualizar o universo das interrogações e dos caminhos possíveis, que melhor se ajustam as inquietações de cada um. Eles abriram, em seus escritos, páginas sob as mais diversas perspectivas. Mas isso tudo não significa de devamos concordar sempre com eles, que não tenhamos idéias próprias sobre a vida e as questões que nos cercam.
As vozes de papel funcionam para nós como guias, uma vez que a verdade ainda não foi conquistada por inteiro, ela está aberta à todos. Mas não se pense que as vozes de papel são vozes mudas. São vozes perseverantes que nunca se calam! Estão sempre lá, dispostas a nos dizer algo, por isso são universais, por isso são eternas. Busca-las é aceitar o desafio intelectual de romper com os grilhões e os limites de pensamento.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Pesquise no Blog
Loading
TEXTOS/ARTIGOS ANTERIORES
-
►
2014
(16)
- ► dezembro 7 (1)
- ► novembro 16 (1)
- ► outubro 19 (1)
- ► setembro 28 (1)
- ► fevereiro 23 (1)
- ► fevereiro 16 (1)
- ► janeiro 26 (1)
- ► janeiro 12 (1)
-
►
2013
(33)
- ► dezembro 29 (2)
- ► dezembro 22 (1)
- ► dezembro 1 (1)
- ► novembro 10 (1)
- ► outubro 27 (1)
- ► outubro 20 (1)
- ► outubro 13 (1)
- ► setembro 29 (1)
- ► setembro 22 (1)
- ► setembro 15 (1)
- ► setembro 1 (1)
- ► fevereiro 17 (1)
- ► fevereiro 3 (1)
- ► janeiro 27 (1)
- ► janeiro 20 (1)
-
►
2012
(38)
- ► dezembro 23 (1)
- ► dezembro 9 (1)
- ► dezembro 2 (1)
- ► novembro 11 (1)
- ► outubro 28 (1)
- ► outubro 21 (1)
- ► setembro 23 (1)
- ► setembro 16 (1)
- ► setembro 9 (1)
- ► fevereiro 26 (1)
- ► fevereiro 19 (1)
- ► fevereiro 12 (1)
- ► fevereiro 5 (1)
- ► janeiro 29 (2)
- ► janeiro 22 (1)
-
►
2011
(63)
- ► dezembro 25 (1)
- ► dezembro 18 (1)
- ► dezembro 11 (3)
- ► dezembro 4 (1)
- ► novembro 27 (2)
- ► novembro 20 (2)
- ► novembro 13 (1)
- ► novembro 6 (1)
- ► outubro 30 (1)
- ► outubro 23 (1)
- ► outubro 16 (1)
- ► setembro 18 (1)
- ► setembro 11 (1)
- ► setembro 4 (2)
- ► fevereiro 27 (1)
- ► fevereiro 20 (1)
- ► fevereiro 13 (1)
- ► fevereiro 6 (1)
- ► janeiro 30 (2)
- ► janeiro 23 (2)
- ► janeiro 16 (1)
-
▼
2010
(55)
- ► dezembro 26 (1)
- ► dezembro 19 (1)
- ► dezembro 12 (2)
- ► dezembro 5 (2)
- ► novembro 28 (1)
- ► novembro 21 (1)
- ► novembro 14 (1)
- ► novembro 7 (2)
- ► outubro 24 (1)
- ► outubro 17 (1)
- ► outubro 10 (1)
- ► setembro 26 (1)
- ► setembro 19 (1)
- ► setembro 12 (2)
- ► setembro 5 (1)
- ► fevereiro 28 (1)
- ► fevereiro 21 (1)
- ► fevereiro 14 (1)
- ► fevereiro 7 (1)
- ► janeiro 24 (1)
- ► janeiro 17 (1)
- ► janeiro 10 (1)
-
►
2009
(37)
- ► dezembro 27 (1)
- ► dezembro 20 (1)
- ► dezembro 6 (1)
- ► novembro 29 (1)
- ► novembro 22 (1)
- ► novembro 8 (1)
- ► novembro 1 (1)
- ► outubro 25 (1)
- ► outubro 18 (1)
- ► outubro 11 (1)
- ► setembro 27 (1)
- ► setembro 20 (1)
- ► setembro 13 (1)
- ► setembro 6 (2)
Nenhum comentário:
Postar um comentário