Em uma interessante crônica intitulada “As perdas & os ganhos”, a escritora Lya Luft, escreve:
“O apoio dos outros é relativo e passageiro. A força decisiva terá de vir do nosso interior, onde vai sendo depositada a bagagem de nossa vida. Lidar com a perda vai depender do que encontraremos ali: se nesse lugar crescem árvores sólidas, teremos onde nos agarrar. Se houver apenas plantinhas rasteiras, estaremos mal. Por isso, aliás, a tragédia faz emergir forças insuspeitadas em algumas pessoas, e para outras aparece como uma injustiça pessoal ou uma traição da vida.”
A metáfora da “árvore” e da “plantinha” é oportuna. Chega um determinado momento da vida de cada um, que ficar plantando somente “plantinha rasteira” não mais atende nossas necessidades. O que seriam, então, essas “plantinhas”? Sim, todos aqueles sentimentos que limitam a vida e que lhe destitui o sentido. O pessimismo, o negativismo, a insegurança, o materialismo, entre outros, são representações concretas da metáfora da “plantinha rasteira”. Por sua vez, a “árvore sólida” é aquela que nos permite “onde nos agarrar”: todas as construções positivas efetuadas no espaço de nosso mundo íntimo e, especialmente, aquelas que nos ofertam uma visão mais ampla e racional da vida.
A árvore frondosa que atinge as alturas ou a plantinha rasteira preza ao solo, simbolizam estados da própria consciência humana. Recebemos constantemente as injunções danosas ou benéficas da vida, conforme pensamos, sentimos e conduzimos o nosso estar-no-mundo.
As escolhas são importantes. Escolher como parceiros íntimos o pessimismo ou o otimismo, a esperança ou a desilusão, a fé ou a descrença, a alegria ou a melancolia, são opções de cada pessoa. Certamente, necessitamos de motivação para revitalizarmos nossas perspectivas e o nosso caminhar. É preciso identificar um, ou vários, sentidos da vida. Sem sentido a vida não tem beleza, tudo é sombrio, desconcertante.
O homem é um ser inquieto e inquietante. Nossas inquietações representam o conteúdo das nossas fragilidades. É verdade, somos seres incompletos. Nossa incompletude nos inquieta e, por isso, vivemos de escolhas e experiências que nos levem a um estado maior de plenitude. Nossas inquietações também representam os significados que atribuímos as coisas.
Aqui vale pensarmos sobre uma fábula interessante. Um homem muito simples e pobre vivia nas imediações de grande castelo fortemente guarnecido. Sem nunca ter lá adentrado, o homem vivia sonhando com as maravilhas que certamente existiriam no interior daquela fortaleza. Curioso e disposto a desvendar tais mistérios, certo dia implorou aos vigilantes que lhe deixassem entrar, seria o maior prêmio de sua vida. Um momento só. Após várias tentativas malogradas, o simples homem recebeu de um vigilante mais sensível a autorização para chegar aos jardins do castelo. Ao transpor a grande muralha, e fitar os jardins, foi tomado pela sensação de estar diante de um grande tesouro. Na verdade, ele observou somente “os jardins”, não entrou em contato com as verdadeiras jóias de ouro e pedras preciosas que a fortaleza velava em suas salas e aposentos.
Somos o “homem simples” que se contenta apenas com os jardins? Ou nossas inquietações nos estimulam a transpor as muralhas conceituais de uma vida simplista, reduzida mera e filosoficamente a um fatalismo biológico?
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